15 de Março de 2017
Quase cancelei a festa que havia preparado para me despedir de amigos e familiares antes de ganhar o mundo. Pensei que gostaria de sair fugida, se possível, disfarçada, sem beijos e palavras de incentivo no aeroporto. Não que eu seja antissocial, nada disto (pô, eu fui colunista social, gente). Apenas, acreditava que o processo de dizer adeus para quem se ama só dificulta o troço. Já está sendo duro desapegar e ainda vou ter que encarar todo este povo que eu amo reafirmando isto? Ah, não! A sensação era a de uma criança que coloca os dedos indicadores fundo nos ouvidos e cantarola “lálálálá” para não escutar o que o coleguinha está falando.
Só que meus amigos de Passo Fundo, Rio e São Paulo já estavam programados para a festa. Os de Porto Alegre também. Mexeram agendas, organizaram-se. Seria um ato de covardia. Neste caso, ok, respira, e vamos encarar este “até logo” de frente. Desde lá – e já se vão cinco dias -, entrei em uma imersão de despedidas. Almoços, jantares, cafés, visitas, ligações, mensagens e muitas, muitas palavras de afeto. Melhor que aniversário. Soltei os braços ao lado do corpo e, devagar, virei as palmas das mãos para frente. Para receber. E vieram as melhores energias. A impressão é que foi dito tudo. Do lado deles. Do meu lado. Choveu “eu te amo”, “eu te admiro”, “conta comigo” e “vou sentir saudades” de ambos. Amuletos, desejo de sorte e diversas mandigas aos poucos abriam as portas para a minha partida. Ninguém pediu para que eu ficasse. Só incentivaram: vai, tá na hora. Está tudo bem. Estamos aqui.
Quem não ligava há tempo, discou. Quem não escrevia, digitou. Até quem não me conhecia entrou nas minhas redes sociais para dizer que simpatizava e queria desejar a melhor jornada. Os que eram poucos íntimos, mas tinham convivência, também optaram por se manifestar. Luz, coragem, força, diziam todos. E agora, escrevo de Guarulhos, na minha primeira conexão, transbordando. A sensação é de que não deixei nada, nadinha para trás. Que se por um acaso, eu não voltasse, estaria tudo resolvido. Disse que amo incontáveis vezes. Recebi em troca.
Enquanto tomava o meu último carioca duplo (lá fora é americano, aff) e me desapegava do pão de queijo observando os aviões indo e vindo, refleti sobre essa enxurrada de boas vibrações. Neste mesmo final de semana, duas situações me colocaram próxima da morte. O Lucas Zuch não é meu amigo. Talvez tenhamos cruzado. Mas é amigo de muitos amigos. O Zuch sofreu um acidente enquanto surfava e está em coma. Situação grave. Nestes dias em que ele não pode falar nem ouvir, dezenas de pessoas declararam todo o seu amor para ele. Com razão. Li tantas palavras lindas que nem sei somar. Gente que escreveu com afeto mesmo. No outro caso, uma conhecida perdeu o irmão mais novo, também de maneira inesperada. As homenagens estiveram lá, evidentes, presentes, intensas.
Só que despedidas não deveriam ser assim, como um monólogo. Deveriam ser exatamente a experiência que descrevi nos primeiros parágrafos. Deveriam ser um esgotamento de palavras e abraços. Mas como é que vamos brigar com o destino e adivinhar, não é? Impossível. Neste caso, acredito em uma solução prática e clichê que venho reforçar com este texto: sempre dar adeus para quem a gente ama encarando como uma despedida de verdade. Não deixar o café para depois. Pedir desculpas mesmo. E abraçar com vontade. Tinha uma amiga que repetia: “não devemos nunca ir dormir brigado com alguém”. Fico pensando aqui: quanto das minhas relações teriam passado em branco se algo acontecesse antes de eu viajar. Quanta gente não teria me olhado afundo e dito tudo que eu precisava ouvir. E quantos “te amo” eu teria deixado passar a quem os merece em looping.
De minha parte, estou aqui torcendo para que o Zuch acorde o quanto antes para ler todas as palavras grandiosas dos amigos e ser abraçado com a veemência de quem partiu para uma viagem longa. E voltou.
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