15 de Março de 2018
Eu lembro. Não preciso nem forçar os olhos para apertar a memória. Estava embarcando rumo a uma Volta ao Mundo. Insegura, oferecendo pontos de interrogação para todos os lados e em um diálogo intenso com o meu corpo. Tinha certeza de que aguentaria, não estava segura de a que custo seria esta sobrevivência. Onde eu estava há dois anos? Na semana seguinte ao término do workshop Aceita Idiota, comandado pelo ator e palhaço Mário Libar, em processo de catarse e determinada a pedir demissão da Zero Hora. E há três anos? Trabalhando como colunista social em um dos maiores casamentos que já cobri, de filhos de autoridades, na Serra Gaúcha, trajando um vestido preto chiquérrimo, na minha melhor forma e com um sorriso de orelha a orelha com as oportunidades que meu cargo profissional me presenteava.
O que há em comum neste triênio? Decisões. Pé no chão. Mudanças. Além do mais importante: realizações. Desde que voltei a Porto Alegre, há exatos três meses, tenho respondido com frequência à pergunta: “E aí? Como é voltar? E a adaptação?” Quer sinceridade? Não há adaptação. Segue tudo na mesma. Caminhei por 270 dias em 360º. Voltei para o ponto de partida e parece que pouco ou nada mudou ao meu redor. O agravante é que não tenho ninguém com quem reconstruir lembranças, o que cria um monólogo de saudades na minha mente – e “deusmelivre” me tornar uma daquelas pessoas com ar nostálgico que vivem de tiradas como “na Europa que é bom”, “ah, mais isto nos Estados Unidos é diferente”. O pessimista é antes de tudo um preguiçoso. Um acomodado. Sabe que é mais fácil reclamar do que agir.
Hoje eu decidi. Neste mesmo 15 de março. Estou rumo a um passo importante e carregado de mais modificações no que reflete a minha construção. Deu frio na barriga. E tudo que gela o estômago é sinal de sangue circulando. De novo, caio naquele clichê de escolhas e renúncias. Mas me afasto do pavor que me causa o comodismo, o medinho do desconhecido e a fadiga de recomeçar. Tipo aquela música fofa que toca na rádio “é que a gente quer crescer e quando cresce quer voltar do início porque um joelho ralado dói menos que um coração partido”. Por menos “e se” e mais “foda-se”, com o perdão da palavra.
Falando nisso, quer saber o ponto fraco do meu reajuste nessa vida de antes? Vocês. Vocês aí que não mudaram neste um ano. Que se distanciaram de mim por perder o brilho no olho, não evoluir e deixar o monstro da futilidade lhe engolir. É complicado observar certos amigos indo embora. E não é por mal, por briga, por desacerto. É por desconexão. Virou uma relação heterogênea, que com força pode até misturar as bases, mas logo se dissolve. Vem comigo: eu jamais, jamais, teria a ousadia de indicar um ano sabático para quem quer que fosse. Está fora do poder da maioria. Mas eu sugiro: olhe para trás e pense onde você estava ano passado. Você se moveu? Os objetivos foram alcançados? Você está, ao menos, trabalhando neles? O que deu frio na espinha? Se nada aconteceu, meu amigo, tem algo muito errado aí dentro. Tente seguir o raciocínio de Fernando Pessoa: “navegar é preciso, viver não é preciso”.
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